Roteiros Turísticos do Património Mundial: A Demanda do Graal
No preciso momento em que se jogava a formação de Portugal como reino independente, apareceram na Europa as famosas narrativas dedicadas à busca do Graal pelos cavaleiros da Távola Redonda. As primeiras versões da história datam de finais do século XII, pelo borgonhês Chrétien de Troyes e pelo francês Robert de Boron (1190) e ainda outra, em 1207, pelo alemão Wolfram von Eschenbach. A versão mais divulgada haveria de ser, porém, de autoria anónima, provavelmente colectiva: o chamado “ciclo da vulgata”, Quest del Saint Graal, escrito por volta de 1210.
Esta versão foi traduzida pouco depois para a língua portuguesa e ficou conhecida como A Demanda do Santo Graal. Contém todos os ingredientes das versões anteriores: cavaleiros virtuosos, da corte do rei Artur, partem em busca da taça onde teria sido recolhido o Sangue de Cristo, depois da crucificação.
O herói principal dá pelo nome de Galaaz que, com os seus companheiros, se embrenha nas espessas florestas do imaginário Reino de Logres, encontrando donzelas belas (e feias...), gente estranha, monstros e dragões, num trajecto enigmático e com traços de magia, que se resume a um objectivo: o encontro do famoso recipiente que é sinónimo da salvação do Homem.
Esta história foi fruto de uma adaptação feita pelos monges de Cister, que tornaram a velha narrativa de origem pagã num texto mais de acordo com os princípios da virtude cristã e da cavalaria espiritual. Porque não, então, projectar o mapa da Demanda do Graal nos territórios do extremo sudoeste europeu, onde existiu um dos mais importantes mosteiros de Cister (Alcobaça), onde as ligações a Borgonha eram evidentes (o cisterciense São Bernardo correspondeu-se com o seu fundador, de ascendente borgonhês, D. Afonso I) e onde permaneceram, em Tomar e imediações, sempre em lugar de grande protagonismo, os cavaleiros dessa ordem guerreira e religiosa, representantes máximos da cavalaria espiritual que o próprio São Bernardo patrocinou e promoveu, conhecidos por Cavaleiros Templários?
Esta geografia imaginária, como se verá, transforma-se então numa geografia mítica que se pode, eventualmente, percorrer com os olhos da imaginação. Os lugares da ficção tornam-se lugares reais, caso queiramos projectá-los nas paisagens do Oeste, carregadas de lendas e mitos, transpondo, sem os esgotar, os símbolos da Demanda.
Como se se tratasse, autenticamente, do Reino de Logres — como se se tratasse das Bretanhas e das Irlandas imaginárias, em que se sobrepõem Hibérnias e Ibérias, e onde finalmente encontramos aquele que pode ser o verdadeiro Porto do Graal… Mas não se trata de esvaziar os símbolos. A demanda é interior e o percurso é íntimo.
Referência: IPPBLIV10349250
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